O pão da Palavra

A onda de ataques a embaixadas americanas, por conta de um possível filme ofensivo à fé islâmica, bem como o clima tenso e de aversões que sempre fracionou culturas ocidentais e orientais, possui graduações preocupantes para todo e qualquer esforço que vise à paz entre os povos. Basta uma leitura superficial desses acontecimentos e teremos combustível e pólvora suficientes para implodir a raça humana. E, o pior, tudo com justificativas e motivações religiosas! Do lado que nos toca, o mestre Jesus – que viveu na pele o clima de hostilidade religiosa de seu tempo – um dia nos recordou uma velha frase do antigo testamento, aparentemente de fácil compreensão, mas de conteúdo teológico sem precedentes: “Não só de pão vive o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus” (Deut 8,3). Os enigmas da fé num Deus único e criador não deveriam abrir mais espaços para as gritantes divergências religiosas entre nós. Já no contexto das tentações (pelas quais o próprio Cristo foi provado) a fome física apresenta-se como a primeira pedra de tropeço dentre os enigmas que enfraquecem a fé humana. Aquele que um dia iria afirmar ser ele próprio o pão da vida, por força de sua palavra (doutrina), iniciou suas pregações mostrando dois grandes aspectos da realidade que nos cerca: a vida material e a vida espiritual. Essas dimensões estão em duelo constante dentro de nós. O homem físico luta com seu homem espiritual. O pão da terra (“ordena que essas pedras se tornem pães”) quer ser mais que o pão da palavra (aquele que sai da boca de Deus e tudo cria). Quando qualquer temente a Deus, independentemente de qual seja sua religião, perceber as incoerências que pratica em nome de uma fé aparente, ações de violência e de intolerância serão arquivadas para sempre nos porões de sua história até então nebulosa, vergonhosa. Desde quando um Deus misericordioso, capaz de rasgados gestos de amor para resgatar e redimir sua criatura mais perfeita faria uso de ações intempestivas, contrárias à sua natureza de Amor, infinito Amor? Esse Deus não existe. Nunca existiu. A compreensão plena da paternidade universal de um Deus é a única verdade capaz de restaurar a sonhada fraternidade humana. Cada religião tem seus códices, costumes e ritos. Cada qual, à sua maneira, busca compreender a Verdade que rege suas caminhadas. A Palavra, escrita ou oral, desde sempre vem revelando e dando pistas dos mistérios de uma força sobrenatural que nos conduz, nos faz gente, nos orienta sempre para o bem, para uma vida sem tantos tropeços e limitações… Por que dificultá-la mais ainda? Por que não edificá-la, juntos, à luz de uma Esperança maior, que nos faça merecer o título mais que amoroso de filhos e filhas de um Deus Único e Verdadeiro? Ora, a Palavra nos diz tudo isso, seja no Alcorão, na Bíblia, ou em qualquer outro livro em que a luz da inspiração divina, apesar da ignorância humana, tentou contacto conosco. Não, não vivemos só de pão. Precisamos, sim, do alimento espiritual que nos difere de simples e meras criaturas preocupadas com o estomago vazio, a cama, o bolso. Qualquer que seja nossa posição diante de ações de intolerância religiosa, cultural, racial, lembremo-nos que os grandes profetas não foram apenas personagens de escrituras religiosas do passado. Muitos ainda estão por aí, nos dias de hoje. Não defendem uma denominação religiosa por excelência, mas oferecem ao mundo um pão único e verdadeiro, “descido do céu” qual maná, para alimentar a fome humana pela paz universal. Essa é a Palavra, a Promessa. Independe de fanatismo, de credo, de cultura. Profeta do mundo moderno é todo aquele que acredita na palavra e a põe em pratica, que faz da esperança um pão consistente para todos. “E a Palavra se fez Carne”. Você é carne, pão-palavra, profeta, graças à Palavra que o criou. WAGNER PEDRO MENEZES wagner@meac.com.br

Compartilhar: