Quando o presidente norte americano autorizou a invasão do Iraque em 2004, dando início ao que chamou de guerra do Bem contra o Mal, deixou escapar uma frase para justificar sua decisão: “Deus está do nosso lado”.
Diferentemente de seu colega e outrora presidente Abraham Lincoln, que diante das ameaças à integridade de seu povo acabou dizendo: “Temos de estar ao lado de Deus”.
O apelo ao divino, em ambos os casos, soam idênticos à primeira vista. Apresentam, no entanto, gritante e profunda diferença. No primeiro, impera a prepotência dos donos da verdade. No segundo, a humildade dos que desejam o privilégio e o mérito da graça de Deus.
Reporto a esses paralelos, para abordar um assunto que preocupa o mundo cristão: a unidade. É esta a pauta do momento. O povo de Deus dobra os joelhos para orar pela unidade. Não há aqui nenhuma beligerância com o aparato das armas, mas verdadeira guerra se trava nos bastidores das modernas catacumbas cristãs. A separação continua como contraponto vergonhoso entre os seguidores do mestre do diálogo e da reconciliação. Esta é a maior chaga do corpo místico de Cristo – a intolerância, as divergências, a competição, o oportunismo entre aqueles que se dizem irmãos…
Todos proclamam: “Deus está do nosso lado”. Todos se sentem donos da Verdade, quando o que possuem é tão somente a pequena e pobre verdade de suas confusas crenças e teorias. Antes do engrandecimento destas, a fé nos ensina a exercitar nossos conceitos: “Temos que estar ao lado de Deus”. Temos que fazer por merecer. Buscar, com nossa unidade e testemunho de fé, o prêmio comum e acessível a todos os que creem nas promessas de Jesus. Então poderemos nos questionar: quem está ao lado de quem?
Sempre é bom recordar as últimas instruções do mestre aos seus discípulos. Ao redor daquela mesa, altar do sacrifício e da reconciliação universal, o pão da unidade foi Ele próprio. Em alta voz proferiu sua oração sacerdotal, inserindo seus ouvintes no contexto do que pedia a Deus. “Para que todos sejam um, assim como tu, Pai, estás em mim e eu em ti, para que também eles estejam em nós e o mundo creia que tu me enviaste” (João 20,21).
Quão distante estamos! O que vemos acontecer entre os cristãos é o oposto da fervorosa oração da unidade: “Dei-lhes a glória que me deste, para que sejam um, como nós somos um” (22). O que vemos é o oportunismo de muitos, a maquiavélica ação de sanguessugas da já debilitada espiritualidade do povo, a sistemática exploração das carências primárias desse povo, o distanciar-se galopante da coerência entre prática e doutrina. A primeira completamente oposta à segunda. Introduzem e revitalizam a máxima: “Façam o que falo, não o que faço”. Até quando, Senhor?
Há sempre uma luz. Essa não se esconde, porque está acima da verdade que construímos. As contradições são humanas, passíveis de mudanças. Buscar o eixo, o rumo da missão cristã no mundo, como povo, como igreja, como membros do corpo de Cristo, é buscar a Verdade. Essa se constrói respeitando as diversidades, valorizando o que é comum e essencial a todos. Se não nos colocamos ao lado dos irmãos, nunca estaremos ao lado de Deus. O desafio à unidade é o ápice da vivência cristã, sobre a qual se mede o grau de autenticidade da vida cristã. É o testemunho que devemos ao mundo. É a verdadeira guerra do Bem contra o Mal.
WAGNER PEDRO MENEZES wagner@meac.com.br