COLO DE MÃE

Das cenas marcantes do Gólgota, sem sombras de dúvidas, escolho aquela imaginada e registrada por Michelangelo como a mais inquietante. Também, pudera, um filho morto entregue aos braços da mãe! Esculpida no mais caro e melhor mármore do mundo, a pedra de Carrara, a imagem da virgem Maria com Jesus morto nos braços é considerada uma das mais perfeitas e encantadoras obras cinzeladas por mãos humanas. Recebeu o nome italiano de Pietà ou Piedade para nossa linguagem lusitana. Cristo crucificado é o auge dessa história de um amor tresloucado – o amor do Criador para com sua criatura – mas não há como ser insensível diante da comovente cena do filho morto no colo da mãe. Aliás, todas as etapas da via-crúcis cristã são por demais contundentes com o indiferentismo daqueles que figuraram (e ainda figuram) no misterioso quadro da Paixão e Morte de um Deus. Só ganham o perfume da consolação e possível aceitação quando a figura de Maria entra na cena. Mesmo ao longe – como quando se desesperou ao saber que Pilatos lavara as mãos e entregara à morte seu único filho – seu olhar materno certamente buscou o olhar aflito do filho e o inundou com o lenitivo de seu amor incondicional. Depois, na quarta estação de dor e decepção, Maria se encontra com seu filho e passa a caminhar com ele, perfazendo um caminho pedregoso, humilhante, de quedas constantes, degradantes, mas que a mágica e silenciosa presença materna – só ela! – é capaz de dar forças além das próprias forças; que só um coração de mãe é capaz – ou pensa ser capaz; ou até desconhece que é capaz – de proporcionar. Quem desconhece a poderosa força de fé e coragem que flui de um coração materno? Pois Maria não precisou dizer nada, nem chorar, nem se lamentar… Bastou olhar nos olhos, no fundo dos olhos de seu precioso rebento e neles colocar um pouco de sua dor, mas muito de seu amor… Bastou isso, somente isso! Então Jesus prossegue na dura caminhada para a morte. Mais dois tombos, a solidariedade quase obrigada, impingida, de um Cirineu pouco lhe atenuou o sofrimento, mas fez questão de parar diante das mulheres – dentre elas certamente sua mãe – olhar-lhes nos olhos e as consolar com um enigmático conselho: “Filhas de Jerusalém, não choreis sobre mim, mas chorai sobre vós mesmas e sobre vossos filhos” (Lc 23,28). Logo estaria crucificado. Depois morto e entregue aos braços da mãe. Piedade, piedade! Só então é que a ternura de um olhar materno nos dá a dimensão exata do maior crime da humanidade… Só ali, inerte, derrotado em sua frágil condição humana, é que a figura materna se agiganta diante de nossos olhos, apenas para nos dizer de sua importância, sua sagrada e sublime missão de abrigar em seus braços as filhas e filhos aparentemente destroçados e mortos insepultos pelas mazelas de um mundo sem fé, sem esperança. Descem o filho da cruz para o colo da Mãe! O regaço mais acolhedor, o único e definitivo embalo do verdadeiro ninar, consolar, retornar para a vida, a verdadeira vida, só um colo materno pode oferecer! Atentem mães, observem Maria e sua dor: mesmo esvaída em lágrimas, logo mais teria seu filho de volta, ressuscitado! Filhas do mundo de hoje, não chorem a dor de um passado. Aquela dor, Cristo já curou. Chorem, sim, pela dor do presente que torna insensível muitos corações maternos e indiferentes muitos dos filhos e filhas resgatados no Amor de Deus ao custo de dores e sofrimentos sem limites. Chorem por vocês, pelos seus filhos sem o colo da Mãe… WAGNER PEDRO MENEZES wagner@meac.com.br

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