Um dia termina, outro começa. Assim também anos, séculos, milênios…No alvorecer de um novo ano há sempre as reminiscências do que se foi. Ter sido bom ou ruim depende da perspectiva de cada um. O fato é que sobrevivemos, ultrapassamos os umbrais de um novo tempo. Ao último coube a missão de apagar as luzes, fechar portas e janelas, exalar o perfume no ar ou sacudir a poeira dos pés. Ilusoriamente, é assim que nos despedimos do passado. Ontem foi ontem, o que vale é o hoje, o presente. “Completaram-se os dias para a purificação”, nos diz o último dos evangelhos do ano, quando celebramos o Dia da Sagrada Família. Aqui está o gancho, o fio da meada dessa oportuna reflexão no início de um novo tempo que chega. Segundo a tradição judaica, após o nascimento de uma criança observava-se um período pós-parto, quando mãe e criança se resguardavam do esforço exaurido para se alcançar “vida nova”. Após vencer essa etapa, obrigatoriamente, eram conduzidos ao templo, para apresentar o recém-nascido ao Senhor. “Todo primogênito do sexo masculino” era consagrado solenemente a Deus. O menino Jesus se enquadrava no privilégio dessa consagração, apesar de sua origem divina já o consagrar como oferta viva e perene de Deus aos homens. Mas lei é lei, se cumpre! O cumprimento desta passa pelas expectativas da história humana, onde o que existia ( e continua a existir) era a esperança de um novo tempo, o sonho de liberdade perene advindo da promessa de um Messias, um salvador. Tal qual o sonho do velho Simeão, que ansiava contemplar a face serena e promissora desse libertador do seu povo sofrido. Eis que lhe foi concedida essa graça. Com o menino nos braços, naquele encontro casual no templo, Simeão agradeceu: “Agora, Senhor, conforme a tua promessa, podes deixar teu servo partir em paz; porque meus olhos viram a tua salvação” (Lc 2,29-30). Nisso resulta a fé dos que leem nos acontecimentos do dia a dia a ação sempre generosa de Deus. Não são as trevas do passado motivos de pânico e desânimo pelas expectativas futuras. Quando a esperança é maior que a realidade que nos cerca, com certeza, daremos aos nossos braços a oportunidade de embalar um sonho envolto na imagem de uma criança consagrada; uma criança-esperança que nasce todos os dias, tal qual o menino Jesus apresentado naquele Templo. Também somos templo! Templos vivos do Espírito Santo. Também é possível remexer nossos sonhos e esperanças, tirar deles o mofo que deixamos acumular, fazê-los reluzir novamente à luz da fé que ainda nos sobra e encontrar, dentro de nós mesmos, a face sempre serena e sorridente desse menino de luz. “Esse menino vai ser causa tanto de queda como de reerguimento para muitos…” Esse menino renasce sempre, a cada ano, a cada nova etapa de nossas vidas, com o propósito único de renovar e fortalecer nossos sonhos e esperanças. “Assim serão revelados os pensamentos de muitos corações”, profetizou Simeão, para calcar em nossos propósitos de vida uma fé além e acima de nossa cruenta realidade. Agora depende de nós. Ser boa ou ruim a história que hoje escrevemos, com a nossa vida, depende de cada um de nós. Não fiquemos só na expectativa de um novo tempo, uma realidade nova. Os sonhos são passíveis de realização. se nossa vontade for maior. Se nossos esforços seguirem os passos da Sagrada Família, aquela que nos deu exemplo em tudo, até na dor, na desesperança de momentos. Porém, como o salmista, devemos lembrar: “A esperança dos maus dá em nada” (Sl 112). Acenda sua luz.
WAGNER PEDRO MENEZES
wagner@meac.com.br