Retomando “Laudato Si”, a espetacular carta do papa Francisco “aos homens de boa vontade”, seu segundo capítulo refere-se às convicções de fé. “Não ignoro que alguns consideram-na (a fé) irrelevante, chegando ao ponto de relegar para o reino irracional a riqueza que as religiões possam oferecer para uma ecologia integral” (62). Não há porque esconder “a arte, a poesia, a vida interior e a espiritualidade” da pessoa de fé, capaz de contribuir em muito com a preservação da vida e dos territórios onde Deus o colocou. “Além disso, a Igreja Católica está aberta ao diálogo com o pensamento filosófico, o que lhe permite produzir várias sínteses entre fé e razão” (63). O zelo para com a casa de Deus – por consequência o mundo e seu Universo – faz parte da nossa fé. O fato é que existimos. Deus, na narrativa do Gênesis, “viu que tudo era bom” e colocou a humanidade num paraíso que exigia três relações vitais: “com Deus, com o próximo e com a terra”. Essa ruptura quebrou a harmonia e o resultado foi o início do conflito entre o ser humano e a natureza. “O pecado manifesta-se hoje, com toda sua força de destruição, nas guerras, nas várias formas de violência e abuso, no abandono dos mais frágeis, nos ataques contra a natureza” (66). Os textos bíblicos nos convidam a o jardim do mundo (cf. Gn 2,15). Enquanto quer dizer lavrar ou trabalhar um terreno, significa proteger, cuidar, preservar, velar”. O poema da Criação já nos ensinava a arte da preservação. “A melhor maneira de colocar o ser humano no seu lugar e acabar com a sua pretensão de ser dominador absoluto da terra, é voltar a propor a figura de um Pai criador”. (75) “Se reconhecermos o valor e a fragilidade da natureza e, ao mesmo tempo, as capacidades que o Criador nos deu, poderemos acabar com o mito do progresso material ilimitado” (78) Tudo se move para um fim determinado. Para nossa fé, a meta do universo situa-se na plenitude de Deus. “Quando nos damos conta do reflexo de Deus em tudo o que existe, o coração experimenta o desejo de adorar o Senhor por todas as suas criaturas” (87) “Isto gera a convicção de que nós e todos os seres do universo, sendo criados pelo mesmo Pai, estamos unidos por laços invisíveis e formamos uma espécie de família universal” (89). Por isso, somos parte desse universo, crendo ou não nos mistérios que a fé nos ensina. Ao menos, estamos “de acordo que a terra é, essencialmente, uma herança comum” (93). O olhar de Jesus retoma a fé bíblica no Deus criador. “Olhai as aves do céu: não semeiam nem ceifam nem recolhem em celeiros (Mt 6,26). “Quando percorria os quatro cantos da sua terra, detinha-Se a contemplar a beleza semeada por seu Pai” (97). Vivia harmoniosamente com seu mundo. “Segundo a compreensão cristã da realidade, o destino da criação inteira passa pelo mistério de Cristo, que nela está presente desde a origem”. Por isso cremos em Deus-Pai, todo poderoso e em Jesus Cristo, que ressuscitou dos mortos. “Uma pessoa da Santíssima Trindade inseriu-Se no universo criado” (99). A vida de Jesus nos mostra “uma relação tão concreta e amorosa com o mundo; mostra-no-Lo também ressuscitado e glorioso, presente em toda a criação com seu domínio universal” (100). Assim, a fé cristã caminha para um destino de plenitude, como o Mestre ensinou com sua vida. “As próprias flores do campo e as aves que Ele, admirado, contemplou com os seus olhos humanos, agora estão cheias da sua presença luminosa” (101). “Louvado sejas, meu Senhor, com todas as tuas criaturas”, cantou Francisco, aquele pobrezinho de Assis. WAGNER PEDRO MENEZES wagner@meac.com.br