A transfiguração de Jesus a três de seus discípulos, no monte Tabor, foi um momento de glória, mas não o único, não o último. Os evangelhos não registraram, mas Pedro deixou escapar uma pista do que teria sido um Sermão da Montanha renovado e redivivo, num monte com todas as características do Tabor. Pelo menos geográfica e historicamente se considerando essa hipótese. Ali, durante um dos quarenta dias de sua vida ressurreta, Cristo reuniu mais de quinhentas pessoas e lhes dirigiu um último e definitivo sermão, transfigurado em sua glória. É provável que naquela ocasião Cristo tenha oficializado publicamente a autoridade de Pedro e lhe confiou o rebanho outrora disperso pelos horrores de sua paixão e morte. A pista deste sermão desconhecido está em 1Cor, 15, 4: “Depois apareceu a mais de quinhentos irmãos de uma vez”. Ora, reunir tão grande multidão sem nada lhes falar seria perda de tempo. Ainda mais se considerando que, momentos antes, Cristo havia exortado a Pedro, por três vezes consecutivas, a apascentar o seu rebanho. O mesmo rebanho disperso e que agora retornava pelas diversas trilhas que conduz ao Tabor, para ouvir mais uma vez o mestre. Lembremo-nos que suas aparições na Galiléia se deram durante quarenta dias, antes da Festa de Pentecostes, antes que o Paráclito assumisse seu posto definitivo. Até lá, Cristo continuou exortando seu povo. Com Pedro, que não mais sabia como provar sua fé depois da vergonhosa e tríplice negação, as palavras do ressuscitado foram duras e reveladoras: “Quando tiveres envelhecido, estenderás tuas mãos e outro te cingirá e te levará aonde não queres”. Ou seja, por causa das minhas palavras, hás de morrer… Mas o que teria dito Jesus àquela multidão? Não foi, com certeza, um sermão mais suave do que aquele que ouviu Pedro em particular. Foram palavras duras, amargas diante da realidade, que exortava a todos para a perseverança, expunha os sofrimentos que viriam sobre aqueles que optassem pela prática de sua doutrina, que se congregassem ao redor de seu nome e empunhassem sua bandeira. Não seria um caminho fácil, deveriam saber. Esta fala secreta era um sermão da montanha com o amargo gosto da esponja embebida em vinagre. Quem nos relata detalhes desse sermão é a beata Anna Catharina Emmerich (1774-1824) que publicou nada mais, nada menos do que quarenta volumes de suas visões e “diálogos” com Cristo. No livro “Vida, Paixão e Glorificação do Cordeiro de Deus” ela nos conta: “No cume do monte havia uma escavação, em cujo centro se achava uma coluna que servia como púlpito… Vi, porém, (narra a piedosa freira) Jesus vindo da mesma direção da qual viera Pedro… O Senhor avançou para o centro, onde antes estivera Pedro, que então se colocou em frente. Jesus falou da necessidade de se abandonar tudo e de imitá-lo e da perseguição que teriam de sofrer”. Visões de uma simples mortal, uma beata qualquer! – exclamam os céticos. Mas é através das mais simples e puras criaturas que Deus nos fala, até mesmo nos nossos dias. Então não é difícil imaginar tudo o que se passou naquele monte. Muitos, com certeza, ficaram por ali mesmo, abandonando por completo o desafio que lhes era proposto. A dura fala do mestre, mostrando-lhes com clareza os dias de angústia, a perseguição, as dores do caminho, os desafios, a incerteza e incompreensão, a morte… ah, isso não combinava com a proposta de um novo Reino… Dos quinhentos, poucos restaram. Desses nasceu a Igreja, purificada na dor e alicerçada na Promessa do Reino que não é deste mundo. Certamente, desse sermão secreto, só nos chegou seu final: “Todo poder me foi dado no céu e na terra. Ide, pois, ensinai a todas as gentes… E eu estarei convosco todos os dias até a consumação dos séculos”. O conteúdo secreto do sermão a história nos conta e não é difícil imaginá-lo nos dias de hoje. WAGNER PEDRO MENEZES wagner@meac.com.br