Uma das normas de etiquetas mais naturalmente observadas por um bom civilizado é manter a ordem num ambiente que se usa. Seja este um quarto de hotel, um banheiro ou uma área de lazer qualquer. Fazemos questão de usá-los para nosso repouso, necessidade ou diversão e depois devolvê-lo de forma minimamente ordenada, repondo cada coisa em seu lugar. Mas o que se diria de um túmulo, a última morada a ocuparmos?
Primeiramente esse reduto ninguém anseia por ocupar. Segundo que dele ninguém almeja escapar, nem imagina como. Terceiro que nenhum mortal de lá saiu – a não ser Lázaro enrolado em panos mortuários e seu amigo Jesus
– possibilitando-nos imaginar o grotesco da cena. Para o primeiro, com certeza, o que mais desejou era desvencilhar-se daqueles panos e afastar-se o mais rapidamente daquele local. Não desejou sequer examinar a cova que lhe dera abrigo na escuridão da morte momentânea. Já a sepultura de Jesus não lhe pareceu tão aterradora ao acordar tragado por ela. Ao contrário, levantou-se ciente de nova vida a pulsar em seu corpo renovado, encheu os peitos num suspiro de gratidão ao Pai, deixou de lado os panos que o cobriam, mas o lençol mortuário que lhe tocou diretamente as feridas fez questão de dobrar cuidadosamente e o depositar num “lugar à parte” (Jo 20,7). Por que tamanho desvelo com um simples pano?
Eis que esse pano subsistiu ao tempo e chegou até nós. É o misterioso sudário de Turim, um linho manchado de sangue, com a estampa de um homem que sofreu o suplício da cruz e o flagelo de muitos açoites, bem como a coroação de espinhos. Um retrato vivo do Cristo de Nazaré! Uma lembrança aterradora de sua paixão e morte estampada em seus mínimos detalhes, que o homem moderno ainda não conseguiu desvendar em todos os seus nuances e mistérios. Como um linho tão grotesco – cuja datação e confecção coincidem com os primeiros anos da era cristã – chegou até nós? Qual seu significado, sua mensagem, sua inexplicável durabilidade? O mundo da ciência, por mais sofisticação que consiga obter, não nos dá respostas plausíveis. Cientistas do mundo todo já se debruçaram sobre esses lençóis e silenciaram-se em seus argumentos tecnológicos. A única resposta é a certeza de um mistério. E mistério não se explica.
A aparente etiqueta praticada pelo ressuscitado tinha um destinatário específico: o homem moderno. Durante séculos essa prova indubitável do milagre da ressurreição esteve oculta e desconhecida do mundo. Sua descoberta na era moderna hoje nos parece mais um capricho divino a derrubar as paredes de nossa prepotência e vã sabedoria. O homem encheu-se de conhecimentos tecnológicos, sondou as profundezas de seus mares e oceanos, vasculhou seu universo interestelar, deixou pegadas em sua lua, vasculhou o micro e o macrocosmo, fez proezas no mundo das telecomunicações, conseguiu milagres na cura de suas doenças, clonou a vida…, mas ainda não desvendou os mistérios de um pano dobrado numa sepultura vazia! Eis a prova que Jesus nos deixou ao ocupar os aposentos da morte humana. Verdadeiramente, ali não seria sua morada definitiva…
ET: Recebo via mensagem eletrônica um comentário oportuno. A tradição do lenço dobrado vem de um costume da antiguidade. Quando um Senhor era servido à mesa, seus servos ficavam ocultos no ambiente, à espera de qualquer necessidade ou solicitação do amo. Ao terminar a refeição, o Senhor satisfeito embolava o guardanapo e o atirava à mesa, como a dizer: “Acabei”. Mas, se este Senhor dobrasse criteriosamente aquele pano, significava: “Não tire a mesa, ainda não terminei”. Em outras palavras:
“AGUARDE, EU VOLTAREI”.
WAGNER PEDRO MENEZES
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