No limiar de mais um ano, quando sinos repicam anunciando a pureza e simplicidade de uma manjedoura revestida de luz, eis que a Igreja traz boas notícias para o povo brasileiro: a beatificação de Irmã Dulce e a conclusão do processo de canonização (fase diocesana) do advogado Franz de Castro. Parece-nos que, finalmente, a galeria dos santos brasileiros tende a aumentar. Da Irmã Dulce qualquer bom cristão ainda se lembra. Falecida aos 13 de março de 1992, construiu sua história em meio aos pobres de Salvador, na Bahia, onde realizou inúmeras obras de assistência social contando apenas e unicamente com a Providência Divina e a ajuda popular. Dentre suas obras, destaca-se o Hospital Santo Antonio, que nasceu dum velho galinheiro adaptado e se tornou uma referência no serviço à saúde, na educação sanitária e no modelo de assistência social sem fins lucrativos, o mais eficiente de que se tem notícia neste país. Diante da grandiosidade de seus projetos e do sucesso que conseguia sempre, um repórter lhe perguntou: Irmã Dulce, quando Deus a chamar, quem continuará sua obra? Sem pestanejar, disse achar natural esse receio em assumir responsabilidades, mas Deus era dono da obra e Ele certamente saberia o que fazer. E soube. Passados anos, sua obra continua viva, atuante, vibrante como sempre. Sua biografia não nos apresenta uma pessoa forte, segura de si, determinada sempre. Ao contrário, era uma mulher franzina, de um metro e meio de altura, pesando pouco mais de 40 quilos, que sofria de enfisema pulmonar e tinha uma capacidade respiratória de apenas 35 por cento. Dormia numa espreguiçadeira, sentada, nunca passando de quatro horas por noite. Não sabia o que era deitar-se numa cama, pois se assim o fizesse correria o risco de morrer asfixiada. Tossia muito e tinha a voz debilitada. Mas na hora de agir, em defesa dos pobres, era como um gigante. Agora sua imagem aparentemente franzina está prestes a galgar os altares da devoção católica, como modelo de santidade e de virtudes cristãs. Basta mais um milagre comprovado pelo Vaticano para Dulce dos Pobres ser declarada santa. Já Franz de Castro Holzwarth, nascido em Barra do Piraí (RJ), pode se tornar o primeiro advogado santo da história da nossa Igreja. Quem disse que advogado não vai pro céu? Pois sim, eis que neste país de tanto descrédito nas leis e na justiça, não só existe essa possibilidade, como também até a possibilidade de galgar nossos altares. Talvez seja este o primeiro santo de paletó e gravata que a história recente do nosso país possa apresentar ao mundo. Tudo aconteceu ainda ontem, ou seja, no dia 14 de fevereiro de 1981. Voluntário da Associação de Proteção aos Condenados (Apac), o jovem advogado ajudava na evangelização dos detentos de Jacareí (SP), quando aconteceu uma rebelião de presos. Percebendo a gravidade daquela situação e num gesto de estremado amor, Franz troca de lugar com um dos reféns, pensando em assim proteger aqueles detentos que fugiam. Mas um tiroteio inoportuno mata os cinco fugitivos e o refém voluntário, Dr. Frank. Pela conduta e atuação cristã, pelo testemunho de solidariedade e pela lisura profissional, Frank de Castro poderá ser beatificado e posteriormente canonizado como o primeiro mártir brasileiro. Além disso, seu martírio está bem documentado com gravações do jornalista Carlos Nascimento para uma TV nacional. Por essas e outras, louvo a Deus pelo dom da santidade. Essa que não é impossível, nem distante de nossa realidade. Essa que também se dirige a nós, como convite nunca utópico, nem audacioso, nem prepotente, nem fruto da vaidade pessoal, do ser mais que os demais. Santidade que compete a todos, é direito de todos os que almejam a Perfeição. Esta que só Deus pode nos conceder. E concede. Principalmente quando permitimos seu “nascimento” em nós, no meio de nós. Feliz e santo Natal! WAGNER PEDRO MENEZES wagner@meac.com.br