UM JOÃO NINGUÉM

Diz a sabedoria popular: “Não dê trela para um louco, senão você acaba igual”. Mas é na loucura de muitos que encontramos a verdade em plenitude. Ao menos foi assim que se nos revelou a mais cristalina das verdades humanas. Eis que um maltrapilho e andarilho, um quase esmoler das nossas vilas e cercanias, andava por aí gritando que o tempo já se cumpriu, nova aurora se anunciava, que os dias que tantos sonhavam estavam chegando. O pobre esfarrapado nem calçado tinha. Vestia-se com peles e comia gafanhotos embebidos em mel silvestre. E gritava em alto e bom som as verdades que seu peito retinha: “Daquele que vem não sou digno sequer de desatar seus calçados!” Sim, esse era o profeta de um novo tempo. Não era o Messias como muitos pensavam, mas seu discurso possuía o timbre de uma revelação maravilhosa. Tal qual aquele louco que perambulava pelas ruas de um Rio dum janeiro qualquer, num passado bem recente, clamando por mais gentileza aos transeuntes apressados pela correria dos nossos tempos. Cuidado, devagar! “Gentileza gera gentileza!”, dizia a todos. Da mesma forma, aquele às margens de um outro rio, um Jordão puro e cristalino, também dizia: “Vigiai, vigiai!” Estejam atentos, pois a pureza dessas águas não se compara com a força transformadora e cristalina da promessa que Ele vai realizar: seu batismo no Espírito. O caudaloso rio que renova a vida do nosso deserto não se compara em nada ao rio de graças e bênçãos que “Aquele que vós não conheceis – e que vem depois de mim” (Jo 1, 26) – tem para nos oferecer. Esse João Ninguém , mesmo assim, continuava seu rito de iniciação, purificando a todos com seu gesto batismal. Daí a importância desse ritual em nossas vidas, o princípio de uma caminhada de fé, o batismo nas águas que nos permite antecipar a necessária preparação para nosso advento espiritual, nossa vida em consonância com os planos de Deus, que nos revela o clima de paz e harmonia sempre presentes em Betânia, além do Jordão. O local das revelações cristãs onde coincidentemente João estava batizando. Betânia tornou-se símbolo de paz e harmonia, uma casa predileta do Cristo entre nós. Ao longo de seu ministério era ali que Jesus refazia suas forças, na companhia de Lázaro, suas irmãs e muitos discípulos amados por Ele. Dentre eles, familiares de João, seu primo que “perdeu a cabeça” pela fé que professou… “Ele não era a luz, mas veio para dar testemunho da luz”. Essa era sua identidade, sua única razão de ser, de existir, que aparentemente nos soa como demência pura e simples, cuja consequência lhe foi fatal, mas nos proporcionou o reconhecimento do Cristo entre nós. Eis sua maior riqueza, a virtude da “gentileza” de revelação profética! Se hoje temos Jesus como a maior dádiva divina, se sua doutrina chegou até nós como o mais perfeito roteiro para se alcançar a plenitude que sonhamos, se nossa história encontrou novo sentido após a aurora do anúncio de que o “Cordeiro de Deus” está entre nós, foi graças à coragem e insanidade de João Batista, a voz que hoje retumba no deserto de nossas tribulações: “Vigiai e orai, pois o Reino de Deus está próximo”!

WAGNER PEDRO MENEZES
wagner@meac.com.br

Compartilhar: