CORTAR O MAL PELA RAIZ

Difícil evitar frases feitas diante da clareza e objetividade da mensagem evangélica. Em especial a que nos apresenta Marcos (9,38…48) quando nos conta o radicalismo com que Jesus condena o pecado. “Se a tua mão, o teu pé ou o teu olho te levam a pecar… corta-os, arranca-os…”. Para a maioria, tais afirmativas chegam a ser assustadoras. Mas há aqueles que chegam à via dos fatos… É claro, desde que essas mutilações sejam aplicadas a outros, não a si próprios. Está nesta área a lei do talião (olho por olho, dente por dente) ou mesmo as muitas atitudes de vingança que aceitamos e praticamos com naturalidade. A pena de morte é uma dessas. Todavia, antes de qualquer ação de radicalismo contra si ou contra um semelhante, a tolerância de Jesus vem primeiro. “Quem não é contra nós é a nosso favor”, diz-nos o mestre no preâmbulo dessa discussão (Mc 9,40). Não vamos exigir do outro a perfeição que não temos, quando bem o sabemos que o processo da redenção não é igual para todos, mas um aprendizado constante que só praticando é que entenderemos sua plenitude. Aqueles, portanto, que não conhecem plenamente os mistérios da nossa fé, mas que tentam imitá-la por “ouvir dizer” ou por respeito e reverência, ou por instinto, intuição talvez, não estão em plena sintonia com os ensinamentos da Igreja, mas buscam entendê-los de uma forma ou outra, não podem ser excluídos do direito à graça e misericórdia divinas. Estão entre os pequeninos para os quais o Reino abrirá por primeiro suas portas. A ingenuidade ou ignorância na fé e ou doutrina não podem ser empecilhos para a salvação. Como vemos, a salvação em Cristo é para todos, mesmo para aqueles que estão fora do seu redil. O que conta é a retidão do coração, a pureza de uma ação construtiva, a tentativa de se fazer o bem, mesmo sem a legitimidade da lei, da doutrina ou da prática comunitária da fé. “Não os proibais, pois ninguém faz milagres em meu nome para depois falar mal de mim”. A tolerância e compreensão desse versículo é princípio do verdadeiro ecumenismo, de que tanto se fala no meio eclesial, mas pouco se aceita quando colocamos nossa ação doutrinária acima da vida caritativa e religiosa. Se alguém não comunga com nosso pensamento, procedimento ou mistérios dogmáticos, não merece nosso respeito, está fora do rebanho dos “eleitos”, pensamos nós. Ora, não somos maiores nem melhores do que estes, simplesmente porque nossa formação é “herança apostólica” ou nosso batismo emerge de uma pia batismal aureolada pelas bênçãos do Espírito, ou porque nossa fé seja mais pura e genuína… Pensamos assim, agimos assim! Mas, na prática, a salvação em Cristo vem donde menos se espera, pois que sua ação no mundo não escolhe rótulos, mas conteúdo, não privilegia os escolhidos, os que dizem “Senhor, Senhor”! Antes, ouve os que assumem a identidade daqueles que Ele chamou como “Homens de Boa Vontade”, que vivem a generosidade e a boa-fé mesmo sem total conhecimento destas. Doravante, tenhamos mais cuidado e respeito com a religiosidade do outro. Se é diferente da nossa, ao menos é mais espontânea e autêntica, pois nasce de uma necessidade humana de Deus. Seus caminhos são difusos, confusas suas práticas e doutrinas. Mas, no fundo, no fundo, buscam os mesmos ideais, possuem a mesma esperança, comungam dos mesmos temores de serem jogados naquele “fogo que não se apaga”, a perdição humana! Acolha-os. Esses também são dos nossos.

WAGNER PEDRO MENEZES
wagner@meac.com.br

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